quinta-feira, 7 de julho de 2011

Versões da paisagem "Cantão"

Como outros amantes de velharias e de faiança portuguesa, tenho vários exemplares de faianças a que se convencionou chamar "Cantão Popular".
São conhecidos no mundo das velharias por Miragaia (Porto), mas a  maior parte será já do século XX, sobretudo de Aveiro e de Gaia, o que será o caso de pratos e travessas que tenho e também uma infusa, iguais a alguns exemplares já mostrados nos blogues Velharias e Lérias e Velharias.


Mas também aparecem nesses blogues peças mais antigas do tipo desta pequena travessa, que comprei já cheia de gatos, mas que achei irresistivelmente encantadora.
Lá está o palácio oriental, a ponte, as árvores estilizadas, as nuvens, os traços a sugerir a água do rio, tudo elementos da paisagem "Cantão", tal como foi por cá reproduzida. Os desenhos da aba repetem-se com ligeiras variações neste género de peças.
 

Há pouco tempo descobri outra travessa, muito maior do que a anterior, desta vez com uma decoração bastante diferente, mas em que se reconhecem os elementos da paisagem Cantão.


Apesar dos gatos e esbeiçadelas, dei  sem grande hesitação os 15€ que me pediram por ela na Feira de Velharias de Aveiro. É uma representação mais tosca das decorações com repetição de motivos que se veem em jarras Miragaia ( nº 253 e 254 do catálogo Fábrica de Louça de Miragaia) e também em pratos ingleses John Meir & Son.


No rio vêem-se agora várias ilhotas, cada uma com o seu edifício, e no desenho central, assim como num outro do lado esquerdo, o palácio oriental parece ter sido transformado em templo cristão, já que se vêem os edifícios encimados por uma cruz... ou serão postes de bandeira que tão populares eram nestas decorações populares?


A ponte parece ter desaparecido do desenho central, a não ser que esteja representada pelas quatro colunas que se vêem do lado direito do edifício central, junto à árvore; no entanto, na forma essas colunas parecem reproduzir os pilares da base do palácio oriental que aparece  no motivo inglês "Willow" de que mostrarei um exemplar mais abaixo.


Penso, no entanto, que há duas pontes, muito singelas, nos pequenos desenhos superiores, dos vários que compõem o motivo do centro da peça.
As árvores já estão a caminho das mais estilizadas que parecem paraquedas em versões posteriores como as marcadas Cavaco Gaia.


Aqui se vê a diferença de tamanho e de opções decorativas entre as duas peças.
A cercadura da aba na segunda travessa também parece ter sido feita à mão como a da primeira, porque o motivo de arabescos e folhas, embora sempre repetido como os que são feitos por estampilha ou stencil, apresenta diferenças na repetição. 
E agora uma revelação a posteriori. Vi há pouco tempo um prato coberto com cercadura semelhante atribuído a Santo António de Vale da Piedade!


Estes pratos são de porcelana chinesa, talvez Qing do século XVIII ou XIX, com as paisagens originais chinesas conhecidas por "Cantão". Curiosamente, há elementos que não constam destas versões originais, nomeadamente a ponte e, no prato de cima, o chorão, mas a paisagem de rio, edifícios ribeirinhos, barcos e barqueiros aparecem nos dois exemplares.
Os ingleses transformaram e popularizaram estas paisagens no motivo "Willow", o salgueiro ou chorão, que também encontramos na faiança portuguesa de Sacavém, Massarelos e outras  e que a Vista Alegre também reproduziu no motivo "Blue Canton".


Travessa inglesa "willow" de John Meir & Son

O "Blue Canton" da Vista Alegre com a marca associada "Mottahedeh"

2 comentários:

  1. Olá Maria Andrade
    Parabéns, duas lindas travessas no motivo cantão popular.
    A primeira bem mais comum do nosso olhar, quanto à segunda a primeira que vejo, linda.

    Em termos de mania de atribuição, confesso que olhando o tardoz das duas são iguais a algumas minhas;esmalte muito brilhante;rebordos cortados;telhado do palácio?com 3 bicos, em jeito de cruz, salgueiros iguais, um de cada lado na mais antiga.
    Na segunda;bordadura de estampa usual e típica em Coimbra, casario,palácio? com o telhado com 3 bicos; esponjado dos salgueiros miudinho .
    Para mim é faiança de Coimbra .

    Peças muito, muito interessantes.
    Bom fim de semana
    Beijos
    Isabel

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  2. Sabe, Maria Isabel, hesitei em classificar a segunda travessa como "cantão popular", é muito diferente do habitual, mas a verdade é que o cenário é cantão embora numa interpretação muito original.
    A primeira e as deste tipo e desta época penso serem todas do Norte, e acho Vila Nova de Gaia onde havia muitas fábricas, uma forte possibilidade. A segunda poderá ser de Coimbra, mas só se for já do século XX porque as pastas de Coimbra do séc. XIX eram em geral mais escuras e grosseiras e também mais pesadas. Neste caso não sou capaz de dar palpites, como aliás em muitos outros casos...
    Li num post seu que anda a tratar de abrir um espaço e talvez por isso tenha andado mais arredada deste mundo bloguista.
    Vá dando notícias, OK?
    Beijos

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