sábado, 30 de abril de 2011

Faianças e porcelanas escatológicas!!!


Apesar do fim a que se destinavam, em Portugal até meados do século XX, estas peças de faiança não deixam de ter a sua graça, até porque eram decoradas com o mesmo cuidado com que se decoravam as peças de mesa ou as mais nobres de higiene.
Gosto de  ver estes "recipientes"com plantas dentro e tenho-os muitas vezes nessa função,  numa casa de banho cá de casa.
O fundo de dois deles a pedido da Maria Isabel
Os dois primeiros exemplares são do tipo geralmente atribuído a faiança de Coimbra. Comprei-os em feiras mas já não estou certa onde ou quando. Acho piada ao das flores, muito popular, mas também gostei do segundo, mais sóbrio, com riscas num bonito azul cobalto.




E como os últimos são os primeiros, o exemplar abaixo foi o primeiro que comprei, num antiquário em Silves, já lá vão uns bons 12 ou mais anos. Ainda me lembro do preço, 4.500$00. Tinha uma esbeiçadela que depois tapei com massa branca e por isso me fizeram aquele preço. Penso que o tipo de flores e folhagens não engana - fabrico do Norte e muito provavelmente Cavaco, Gaia, embora não tenha qualquer marca.

Os nossos antepassados conviviam bem com estes objectos (a isso eram obrigados!!!) e segundo reza a história, até nas salas de banquete estavam presentes os elegantes "bourdaloues" usados pelas senhoras da alta sociedade debaixo dos vestidos muito rodados e armados.

Este é um bourdaloue em porcelana francesa do século XIX, mas também se fabricavam em faiança e em prata.  O nome terá tido origem ironicamente em Louis Bourdaloue (1632-1704) um pregador jesuíta francês  muito dado a extensos e teatrais sermões, o que levava as suas ouvintes a sofrerem horrores na contenção das necessidades fisiológicas. Assim nasceu o hábito de transportarem estas pequenas peças, dentro dos regalos que usavam para aquecer as mãos. Quem adivinharia???



 Acima vêem-se três belíssimos bourdaloues, respetivamente em porcelana de Vincennes, de Sévres e  chinesa de exportação, todos do século XVIII.
Finalmente, o bourdaloue em forma de gato, em porcelana chinesa do século XVIII, funcionando a cauda como  pega e  a cabeça como tampa. Muito engenhoso, sem dúvida!

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Vasos da Fábrica do Carvalhinho

A minha atracção pelas faianças da Fábrica do Carvalhinho, de que já falei num post recente, vem certamente da infância, já que havia em casa da minha avó paterna um pequeno vaso dessa loiça que me encantava. É claro que o meu desejo seria brincar com ele, era mesmo de pequenas dimensões, mas  nunca mo deram para brinquedo e agora compreendo porquê. Entretanto o vasinho deve-se ter partido porque já adulta, quando o procurei,  não o vi por lá. Eu não sabia nada da marca, nem do prestígio e qualidade da faiança, mas atraíam-me as cores claras num motivo delicado e o rebordo azul recortado em biquinhos.



Foi assim que quando eu vi pela primeira vez um vaso semelhante àquele, embora um pouco maior e com outra decoração, não lhe resisti. Foi a primeira das poucas coisas que comprei em leilão, na altura, antes do euro,  por 7.500$00 o que achei muito caro. Eu até tremia ao licitar...
Ao longo do tempo fui comprando outras peças. Para este post selecionei  vasos ou cachepots, alguns com defeito, que comprei relativamente baratos. Como uso alguns com plantas dentro, posso assim admirar as cores e os motivos sem me preocupar tanto em que se partam.


Acima mostro a minha segunda aquisição nesta área, com a respectiva marca. Tem lugar cativo nas minhas escadas interiores com uma planta verde que já dura há anos.


Este par de cachepots penso serem as peças mais antigas que tenho em faiança Carvalhinho, já que não constam junto à marca as anotações Hand Painted, Pintura à mão ou Made in Portugal. De qualquer forma, serão sempre posteriores a 1907, ano da publicação da obra Cerâmica Portugueza e outros Estudos, de José Queirós, uma vez que nessa obra não constam estas marcas da Fábrica do Carvalhinho. As que ele apresenta são várias versões com as iniciais FC, que foram certamente usadas no século XIX e início do século XX.
Comprei o par na feira de velharias de Espinho, com falhas no bordo,  ambos a precisar de restauro, mas tive receio de que perdessem este belo brilho do vidrado e por isso dei-lhes um jeito caseiro e assim ficaram até agora.


Gostei muito não só da decoração vegetalista em dois tons de azul que cobre quase toda a superfície, mas sobretudo do medalhão, ou reserva, com um ingénuo desenho de pássaro com flores no bico.  Este é um motivo recorrente na nossa faiança, provavelmente alusivo à ave bíblica com um ramo de oliveira que anunciou a Noé a proximidade de terra.
  


 Encantei-me por mais este exemplar na feira de velharias de Aveiro e comprei-o por 5 euros, partido e colado. Assim o tive durante algum tempo, no chão da minha entrada, com uma planta dentro, sem se notarem os defeitos. Só que levou um tombo, suponho que do felídeo cá de casa ;) e fui dar com ele em pedaços. Nessa altura, como gosto muito da decoração, decidi-me a mandá-lo restaurar. Perdeu o brilho original, mas manteve a bela decoração com os ramos de flores a cair sobre o bojo.

Na produção artística da Fábrica do Carvalhinho destacam-se pintores de mérito como Carlos Branco, Manuel Guimarães e Tenente Coronel Azevedo. Agrada-me pensar que algum deles possa ter tido intervenção na decoração destas peças pintadas à mão.

terça-feira, 26 de abril de 2011

De novo a porcelana Vista Alegre / Vista Alegre porcelain again

Esta semana vou participar nos eventos de blogues americanos ("Tea Cup Tuesday" ,  "Tea Time Tuesday" e "Teapot and Tea Things Tuesday") confiando no Google Translator, que instalei há pouco. Embora a tradução não seja muito satisfatória, serve para entender o suficiente e tem a vantagem de traduzir para dezenas de idiomas.
Este é um conjunto de peças da Fábrica da Vista Alegre que restaram de um serviço de chá fabricado no final do século XIX. Comprei-as na Feira de Velharias em Algés, por bom preço considerando que têm pelo menos 130 anos, mas a verdade é que estes serviços muito incompletos só interessam a quem tem o vício das antiguidades e velharias e não resiste a estas belezas do passado.


Tanto quanto eu sei, este formato de bule foi usado apenas naquela época, pois conheço outros exemplares - na coleção do Museu da Vista Alegre, por exemplo -  embora com outra decoração, datados do mesmo período. 


No bule de chá, as formas da pega e do bico  lembram pequenos galhos, inspiração em formas da natureza que esta fábrica repetiu noutros modelos.
Agrada-me particularmente a tampa do bule, com a pega em forma de botão e as pequenas folhas em relevo, com contornos a ouro.


Ao contrário do bule, este tipo de chávena e pires foi usado recorrentemente até aos anos 50 do século XX.


Acima vêem-se as marcas do pires, do bule e da chávena, três versões, segundo creio, da marca número 20 da Vista Alegre, descrita como azul grande fogo a pincel, usada entre 1870 e 1880. Esta também poderá ser a marca número 8 ou  número 11 da lista de marcas desta fábrica; a minha dúvida resulta de haver marcas VA azul de um período anterior (1852 - 1869), a azul de mufla, e eu  não saber distinguir se estas são de mufla ou grande fogo. Nunca tinha visto marcas com dois pontos seguidos junto do VA, não sei se foi um acaso ou se isso tem algum significado especial.


sexta-feira, 15 de abril de 2011

Painel de azulejos da Fábrica do Carvalhinho

Nas minhas deambulações pelas ruas antigas do Porto, apetece-me fotografar tudo a eito, tantas e tão bonitas são as fachadas de azulejos bem emoldurados pelas pesadas e belas cantarias de granito, de uma beleza rústica que parece eterna.
Já aqui mostrei, num post de Novembro de 2010, azulejos azuis e brancos da Fábrica do Carvalhinho, com marca FC e com um padrão muito usado no Porto no século XIX, inclusivamente pela Fábrica de Miragaia. Agora trata-se de mostrar uma fachada com magníficos painéis azulejares.

                   

No Largo de S. Domingos, em frente a um prédio com um beiral de faiança que já aqui mostrei, está um edifício com um fantástico revestimento de azulejos da Fábrica do Carvalhinho, assinados pelo pintor  Carlos Branco e pelo desenhador Silvestre Silvestri, como se vê nos cantos inferiores do painel central. Também consta do painel a data de execução, 1906, e as iniciais da firma instalada no prédio, Araújo & Sobrinho, Sucrs. Para além das grinaldas e arabescos, inspirados no gosto neoclássico, vêem-se desenhos alusivos a materiais para desenho e pintura, representando o ramo de negócio da firma.
Consta ainda do painel central uma cabeça de mercúrio, certamente simbolizando o comércio.

                       

Esta  Fábrica do Carvalhinho iniciou a sua actividade na 1ª metade do século XIX, em data que não reúne o consenso dos especialistas na matéria, mas que a própria empresa considerou ser 1840, já que comemorou o centenário em 1940, como se pode ver, embora mal, pela marca do pequeno prato que se segue.


Comprei-o já não sei onde, quando, ou por que preço, mas foi certamente a marca, muito diferente da habitual em círculo, que comandou a aquisição.


As  instalações da fábrica ficavam situadas na Quinta do Carvalhinho, no Porto, mais precisamente na Capela do Senhor do Carvalhinho, junto à Calçada da Corticeira, que sobe da margem do Douro até às Fontainhas.  Durante o século XIX e início do século XX foi sujeita a ampliações no mesmo local e foi desenvolvendo a sua produção, sobretudo de azulejos e de peças de cerâmica decorativa.

A encosta junto ao Douro onde nasceu a Fábrica do Carvalhinho
Esta empresa, como todas as outras empresas do ramo, sofreu a  forte concorrência de cerâmicas  inglesas e francesas, que tinham muita aceitação no nosso mercado. No entanto, conseguiu sobreviver exportando em grande quantidade para o Brasil e para  África, após a ampliação e renovação técnica que efectuou em 1906, enquanto desenvolvia a qualidade artística com pintores de renome como o já referido Carlos Branco. Curiosamente este artista cerâmico, segundo Arthur de Sandão, iniciou-se na arte no final do séc. XIX, com 14 anos de idade, na Fábrica da Fonte Nova em Aveiro.
Em 1923 a Fábrica do Carvalhinho foi transferida para novos e espaçosos edifícios em Vila Nova de Gaia e aí permaneceu até aos anos oitenta do século passado. As antigas instalações do Porto foram ocupadas pela Fábrica da Corticeira que usou  marcas circulares muito semelhantes à conhecida e prestigiada marca do Carvalhinho.

Marca circular da Fábrica do Carvalhinho
Também pintado por Carlos Branco, segundo desenhos de Silvester Silvestri, o Porto exibe este monumental painel que embeleza a fachada lateral da Igreja do Carmo, na Praça Carlos Alberto, datado de 1912 e executado na Fábrica da Torrinha. É um painel historiado, com cenas relativas à fundação da Ordem Carmelita e ao Monte Carmelo, que não passa despercebido ao transeunte mais distraído.

Painel de azulejos da Igreja do Carmo no Porto


terça-feira, 12 de abril de 2011

É tempo de flores! - It's flower time!

 Mais um post bilingue para os encontros de Teacup Tuesday online.
Another bilingual post for the Tea Cup Tuesday online meetings.


Desta vez, porque o Fábio Carvalho da Porcelana Brasil nos brindou com um fabuloso post sobre as decorações "chintz" em loiça, depois de ter mostrado belas peças de fabrico brasileiro da sua coleção, decidi participar no encontro bloguista de terça-feira mostrando algumas loiças que tenho com esse tipo de decoração, de produção portuguesa, alemã e inglesa. São padrões floridos que passaram dos tecidos chintz ou da nossa chita para as porcelanas e faianças.
This time, as Fábio Carvalho of Porcelana Brasil offered us a fabulous post about "chintz" decorations on china, after having shown fine Brasilian-made pieces from his collection, I decided to participate in the American bloggers' Tuesday meeting by showing some ware I have with that type of decoration, of Portuguese, German and English production. They are flowery patterns that moved from the chintz or the Portuguese "chita" fabrics to porcelain and pottery.


Este trio de chávena de chá, pires e prato de bolo foi fabricado na Baviera, Sul da Alemanha, na primeira metade do século XX.
Decoração com lilases na porcelana e mais lilases no paninho de croché. Os lilases estão agora em flor no meu jardim e rescendem de aroma.
This trio of tea cup, saucer and cake plate was made in Bavaria, South Germany, in the first half of the 20th century.
Lilac decoration on the porcelain and more lilac flowers on the crochet traymat. Lilac flowers are now blooming in my garden and they smell beautifully.


Esta é a marca das três peças alemãs. Tem as iniciais  RWK que correspondem ao nome do decorador, Rudolf Wächter, e à cidade onde ele tinha a oficina, Kirchenlamitz. Esta marca foi usada a partir de 1920. Por baixo da marca dourada tem outra a verde, que não consigo decifrar, mas que deve ser a marca da porcelana branca , antes de ser decorada.
This is the backstamp of the three German pieces. It bears the initials RWK which stand for the name of the decorator, Rudolf Wächter, and of the town where he had his studio, Kirchenlamitz. Underneath the golden backstamp there is a green one that must be the backstamp of the white china with no decoration.


Este é um prato da Vista Alegre de aba recortada e moldada. Foi o padrão chintz que me atraiu por nunca o ter visto usado na porcelanaVista Alegre.
This is a plate by the Portuguese Vista Alegre with reticulated and molded border. It was the chintz pattern that attracted me for I had never seen it used on Vista Alegre porcelain.


A marca que se vê foi usada pela Vista Alegre entre 1947 e 1968.
The backstamp you see was used by Vista Alegre between 1947 and 1968.


Agora em vez de lilases vêem-se rosas: rosas de Junho, rosas de Balmoral e ... rosas de Lencastre!!!
São peças em faiança inglesa, fabricadas por James Kent  em Longton  e por Lancaster Sandland em Hanley, duas cidades oleiras do Staffordshire inglês, também a meados do século XX. Gosto especialmente da manteigueira, que acho um pequeno encanto.
Now, instead of lilacs you see roses: June roses, Balmoral roses and ... Lancaster roses!!!
They are English pottery pieces, made by James Kent in Longton and by Lancster Sandland in Hanley, two pottery towns of the English Staffordshire, also by mid-20th century. I specially like the butter dish, which I find a little delight.
De novo, rosas na loiça e mais rosas no naperon de croché.
Again, roses on the tableware and more roses on the crochet doily.


Estas são as marcas respectivamente da manteigueira, do prato de bolo e da chávena de café.
These are the backstamps of the butter dish, the cake plate and the coffee can, respectively.


sábado, 9 de abril de 2011

Apontamentos Arte Nova na Curia - III


O GRANDE HOTEL DA CURIA


O Grande Hotel da Curia incorpora um dos mais antigos edifícios construídos na estância termal da Curia para exploração hoteleira. É constituído por três corpos, correspondentes às sucessivas fases de construção que sofreu durante o século XX.

Postal da colecção do meu amigo Alberto Simões
Começou a sua existência como Villa Figueiredo, mas ao ser tomado à renda pelo grande hoteleiro e impulsionador da Curia Conrad Wissman, foi sujeito a remodelações e inaugurado já como Grande Hotel em 1907.


Nessa altura era constituído por apenas um corpo que se vê nos postais acima , e de que se vêem em baixo os andares superiores.


Tratando-se de um edifício projectado e construído no início do século XX é natural que tenha sofrido influência do gosto dominante à época, a estética Art Nouveau.
O revestimento a telhas de lousa nas paredes das águas-furtadas, assim como o friso de azulejos junto ao beiral, são duas soluções arquitectónicas e decorativas  muito usadas no período Arte Nova. As telhas lembram escamas de peixe, os azulejos apresentam motivos florais, num e noutro caso linhas orgânicas tanto do agrado dos criadores desta corrente artística.

Em mais este postal da colecção Alberto Simões, vê-se o resultado da primeira ampliação do hotel concluída em 1914.


 Ficou assim a parte central da nova fachada sobre o que é hoje a entrada principal. Mais um belo friso de azulejos Art Nouveau e ferros forjados a formar flores estilizadas, iguais aos do primeiro edifício.


O remate superior das janelas em semi-círculo, a conferir um desenho de curvas tão utilizado pela arquitectura deste período,  já poderá antecipar o gosto pelas formas geométricas Arte Déco. 



Nestas grandes janelas da sala biblioteca no rés-do-chão, resultantes de um acrescento mais recente - anos 30 ou 40? - vêem-se  as mesmas linhas curvas e características mísulas com elementos florais,  procurando-se assim manter o estilo dos anteriores edifícios.


A entrada coberta, de que se vê o aspecto exterior na primeira fotografia, foi um acrescento de final do século XX, mas a porta datará do período de ampliação em 1914.


 O belo lustre central, assim como dois mais pequenos, um de cada lado, a complementá-lo, também ilustram bem o gosto da época. Lembram as franjas dos vestidos das "flappers" americanas nos loucos anos vinte.


No interior, o acesso aos andares superiores fazia-se por um  elevador com habitáculo em madeira  numa estrutura de ferro, que ainda lá está embora desactivado.



Também não resisti a fotografar os lavatórios da casa de banho das senhoras no rés-do-chão, com encantadoras loiças decoradas com ramos de flores, assentes em suportes de ferro forjado. Como se pode ver, infelizmente com pouca nitidez, os espelhos têm uma barra de azulejos Arte Nova.

Seguir-se-ão outros postes sobre a Curia, seguindo esta etiqueta.